Em audiência pública, a Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados debateu o Projeto de Lei nº 3.274/2015, que determina que as locadoras de veículos disponham de carros adaptados para pessoas com deficiências e, em caso de clientes com mobilidade reduzida, a entrega do veículo alugado deve ser realizada no aeroporto local.
Ao analisar a proposta em audiência, a advogada da Divisão Jurídica da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) Beatriz Primay chamou a atenção para a lei atual, que define que 5% da frota de uma locadora deve ser composta por veículos adaptados. O texto em tramitação define que deve conter câmbio automático, direção hidráulica, vidros elétricos e comandos manuais de freio e acelerador. Um substitutivo ao projeto diminui a porcentagem para 2% do total de carros.
A advogada ressaltou a disposição da CNC em assegurar os direitos da população com deficiência, mas expôs que a cota determinada pode provocar um efeito de veículos adaptados ociosos, visto que a utilização é extremamente menor do que prevê a matéria. “O percentual do projeto significa 50 mil veículos (que deverão ser adaptados).”, destacou.
Primay apresentou aos parlamentares números e cenários que comprovam a subutilização. Em um estudo realizado em uma locadora, entre novembro de 2016 e o mesmo mês de 2019, apenas quatro veículos adaptados foram requeridos. Segundo censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 6,7% da população brasileira possui algum tipo de deficiência, porém apenas 0,28% possuem Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
Para atender esta população, o custo médio de modificações em um veículo é de R$ 100 mil. “O empresário tem interesse em atender todos os públicos com acessibilidade, mas ela precisa ser sustentável para o empresário e eficiente para o usuário”, explicou. Ela ainda mostrou que parte da população com deficiência ainda não será contemplada com a adaptação sugerida. “Uma parte não será atendida por esta legislação como os que usam lentes corretivas, não conseguem conduzir ou são portadores de outras deficiências”, concluiu.
Em exposição no mesmo sentido, a Associação Nacional de Empresas de Aluguel de Veículos e Gestão de Frotas (Anav), que representa 65% das empresas locadoras de veículos, mostrou que, atualmente, existe um veículo adaptado para 35 pessoas, o que representa 2,8% da frota, o que também provocou na entidade um questionamento quanto ao percentual previsto em lei e no Projeto de Lei em apreciação.
Além de sugerir uma cota menor, levando em conta a quantidade de pessoas com deficiência habilitadas para conduzir veículos, a Anav apresentou a possibilidade de o texto flexibilizar o atendimento, determinando que as empresas disponibilizem motoristas, caso o veículo não atenda à necessidade do usuário, e que o cliente possa ser conduzido pela locadora até o local do aluguel do veículo. O Projeto de Lei dita que os carros devem estar disponíveis nos aeroportos. Muitos, porém, não dispõem de áreas de estacionamento ou parada para as empresas.
O presidente da Associação, Paulo Saad, ressaltou que o setor se movimenta para atender todos com igualdade. “Estamos sempre buscando soluções e a inovação no campo da mobilidade. A Anav é favorável às políticas de inclusão e entende que as empresas estão em evolução e devem evoluir para atender a sociedade neste tema”, ressaltou.
A cota também foi um ponto abordado pelo diretor do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) Frederico Moura, que afirmou a importância de revisitar a lei vigente para adaptar as mudanças da realidade. “Será que é necessário esse número de veículos?”.
Moura apontou que o cliente, de maneira geral, paga mais caro por veículos com algumas comodidades e demonstrou preocupação com a possibilidade de a norma encarecer a diária do aluguel para pessoas com deficiência. “Devemos assegurar à pessoa com deficiência o direito à acessibilidade caso não tenha esse veículo. Aí tem que avaliar se a norma vai trazer mais ônus ou mais bônus para o cidadão”, apontou.
A mesma preocupação foi exposta pelo coordenador-geral de Acessibilidade e Tecnologia Assistiva do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Augusto Fernandes. “A gente precisa equalizar esses números de forma que o mercado venha a dar a resposta e as empresas venham a absorver as demandas.”
Frederico Moura explicou que, para a adaptação de um veículo, a locadora deve seguir três etapas: solicitar a autorização de modificações ao órgão de trânsito local, passar por vistoria de entidade credenciada e, se autorizado, realizar as mudanças necessárias. O Projeto de lei está em análise na Comissão e, se aprovado, segue para apreciação da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.