Para debater as mudanças que surgiram ou foram impulsionadas pela Covid-19, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) realizou um workshop online nesta quinta-feira (18), com a participação de juízes, especialistas do Direito do Trabalho e empresários como Luiza Helena Trajano. Entre os temas, a necessidade de vacinação do empregado, trabalho híbrido e uso de aplicativos de mensagens pelas companhias, visando responder a dúvidas comuns ao setor.
Em vídeo de abertura, o presidente da CNC, José Roberto Tadros, incentivou os empregadores a investirem no diálogo em prol de um ambiente de trabalho mais saudável. “A pandemia afetou muito as relações sindicais e de trabalho. O evento quer contribuir para estreitar ainda mais esse entendimento de empresários da área, para estarmos cientes de que um ambiente negociado é o melhor cenário”, destacou.
O workshop ‘Os Impactos da Pandemia nas Relações de Trabalho’ foi organizado pela Comissão de Negociação Coletiva do Comércio (CNCC), grupo de trabalho da CNC. Ivo Dall’Acqua Júnior, diretor da Confederação, vice-presidente da Fecomércio-SP e presidente da Comissão, destacou que o grupo completa dez anos em 2022 e vem alcançando importantes conquistas para o trabalhador do setor.
“A cada dia aprendo um pouco e me curvo mais à necessidade de diálogo. Neste momento, estamos tentando incorporar os princípios da chamada reforma trabalhista, mas ainda temos muito a caminhar, um desafio extra aos impactos pós-pandemia”, apontou Ivo. Chefe da Divisão Sindical da CNC, Patrícia Duque falou da importância da agenda neste momento. “Podemos discutir as mudanças que vão projetar o futuro das relações de trabalho. Vemos hoje que há discussões no STF mostrando um novo olhar sobre a CLT. Aqui vamos debater um tema que vai impactar todos os segmentos do País”.
Transformação nas empresas
Em painel sobre soluções empresariais, a presidente do Conselho de Administração da Magalu e vice-presidente da Comissão de Negociação Coletiva do Comércio (CNCC), Luiza Helena Trajano, e o presidente da Drogarias Venâncio, Armando Ahmed, apresentaram as medidas adotadas pelas companhias durante o período de crise sanitária, debateram o papel dos sindicatos neste momento de transformação e falaram sobre suas expectativas para o futuro das relações de trabalho.
“Estamos vendo mudanças nas formas de fazer, de ser e de se relacionar. Queremos partir à frente, para uma forma de trabalho totalmente disruptiva, uma vez que estamos sentindo que a revolução está acontecendo”, avaliou o empresário. Já Luiza Trajano destacou o esforço da CNCC, juntamente com outras instituições, para colaborar para que as relações sejam mais leves. “Produtividade tem que ser a palavra-chave. As pessoas têm que ter direito de escolher, produzir e negociar. Os sindicatos devem lutar para gerar empregos e defender o trabalhador e não a burocracia, a amarração”, disse.
Uso de aplicativos de mensagens e imunização
Abordando as novas práticas decorrentes da pandemia, a advogada e professora Vólia Bomfim e o juiz do trabalho do TRT da 3ª Região, Iuri Pinheiro, argumentaram como a incorporação do trabalho remoto traz desafios a empregadores e empregados. O juiz apontou que o Direito do Trabalho está em total efervescência e que a adoção de práticas como o uso de aplicativos de mensagem sem regras pré-estabelecidas pelo empregador tem ocasionado um aumento no número de processos julgados.
“Além das questões de horário, é preciso ter cuidado com o conteúdo divulgado no Whatsapp. Às vezes, é melhor deixar um grupo em que apenas o administrador possa compartilhar, para dirimir os riscos”, sugere Pinheiro. Vólia lembra que há aspectos já contemplados pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), entendendo, por exemplo, o uso de grupos de trabalho como parte do legítimo interesse do empregador, mas é preciso criar regras mínimas para que haja um comportamento mais próximo do ideal.
“Temos casos de pedido de danos morais por dispensa feita via Whatsapp. Reconhecemos que o Judiciário ainda tem uma questão protetiva forte com relação ao trabalhador, mas basta o comunicado chegar ao receptor. Não pode haver abusos, mas a dispensa é direito do empregador”, lembra a especialista. Sobre a obrigatoriedade de vacinação contra o coronavírus, os entendimentos majoritários apontam que o direito coletivo prevalece ao direito individual. Assim, os dois especialistas afirmam que é papel da empresa exigir a imunização, a fim de garantir um ambiente saudável no trabalho presencial.
Regulamentação de novos serviços
Participando de palestra sobre os novos métodos de trabalho, a conselheira da Fecomércio-SP e desembargadora do Trabalho aposentada Maria Cristina Mattioli e o juiz do Trabalho Otávio Calvet debateram as relações profissionais nos negócios digitais, principalmente os que operam via aplicativos de internet. Eles discutiram a regulamentação dessas atividades e a flexibilização das normas, sem deixar de lado a proteção social do indivíduo.
Mattioli explicou que o serviço de entregas por aplicativo, por exemplo, veio para ficar, mas é preciso regulamentar a atividade para que relações de trabalho sejam definidas por meio de acordo coletivo. “O momento é de muita reflexão e negociação. Se partir da premissa de que as relações de trabalho surgem em decorrência de um momento econômico e de uma mínima intervenção estatal, é importante dar o direito maior à autonomia da vontade privada”, afirmou.
Calvet destacou que, apesar de leis concedendo proteção social a diferentes formatos de trabalho, como a Lei do Representante Comercial, e a Lei do Salão Parceiro, a legislação brasileira ainda precisa avançar para estar adequada à realidade trazida pelo mercado digital. “Precisamos de uma nova regulamentação do trabalho humano e não mais do emprego e do empregado. Assim, conseguiremos atingir o objetivo de dar dignidade ao cidadão trabalhador e dar um salto de proteção jurídica com qualidade, dentro da lógica de garantir o mínimo necessário para dar flexibilidade”.