Precatórios uma vitória de Pirro dos credores (Jornal do Commercio de 2 de agosto de 2011)

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Antonio Oliveira Santos
Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo

Antonio Oliveira Santos
Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo

Em duas oportunidades anteriores, manifestamo-nos publicamente em defesa dos legítimos direitos dos contribuintes contra os chamados “precatórios”, que são créditos contra a União, os Estados e os Municípios, devidamente reconhecidos por decisões finais do Judiciário, transitadas em julgado. De um modo geral, os contribuintes começam a ser prejudicados pelo curso processual das ações, absurdamente burocrático e demorado (vide artigos “A PEC do terceiro calote” e “Calote imoral e inconstitucional”, Jornal do Comércio de 15/10/09 e 18/11/09).

Em verdade, foi um verdadeiro calote contra os contribuintes o que fez o Congresso Nacional, ao aprovar e promulgar a Emenda Constitucional nº 62, de 09/12/09. Esse, aliás, como já havíamos salientado, foi o terceiro calote, eis que o primeiro foi concretizado pelo artigo 33 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e o segundo imposto pela Emenda nº 30, de 13/9/2000, que elevou o parcelamento de oito para até dez anos.

A referida Emenda nº 62, a par de dar nova redação ao art. 100 da Constituição (com 16 parágrafos), acrescentou ao ADCT o artigo 97, com 18 parágrafos e 25 incisos, a fim de criar o denominado “regime especial de pagamento de precatórios”, através de uma imensa burocracia contábil e, assim, dificultar aos credores o recebimento de seus créditos. A redação original do art. 100 da Carta de 1988 era suficiente e apropriada para regular os precatórios e proteger o direito de seus titulares, consubstanciado em um artigo e dois parágrafos.

Nos citados artigos publicados no Jornal do Comércio, sustentamos a tripla inconstitucionalidade da Emenda nº 62, pelas seguintes razões: 1ª.) por ter efeito confiscatório, ou seja, a retenção descabida e sem o devido processo legal de créditos de pessoas físicas e jurídicas; 2ª.) por violar o princípio constitucional da igualdade, no tratamento diferenciado entre os créditos das pessoas físicas e jurídicas contra a Fazenda Pública e os procedimentos e privilégios nas cobranças draconianas dos créditos destas contra os contribuintes em geral; e 3ª.) por ofender o princípio constitucional da moralidade, que orienta a atuação da Administração Pública, ao impor um tratamento notoriamente lesivo aos credores.

Diante desse quadro, merece o aplauso da sociedade brasileira a recente decisão do Supremo Tribunal Federal, que considerou inconstitucional o parcelamento, em até dez anos, imposto pela mencionada Emenda nº 30/2000, tendo em vista que seu art. 2º. “violou o direito adquirido do beneficiário do precatório, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada” e “atentou contra a independência do Poder Judiciário”.

A sociedade brasileira deve, agora, aguardar que o Supremo Tribunal Federal, numa das ADIN’s submetidas a seu julgamento, também considere inconstitucional a Emenda nº 62, de 2009, a que instituiu o terceiro calote, ou seja, o “regime especial de pagamento dos precatórios”.

Resta consignar, ainda, que a Emenda nº 62/2009 prescreveu que, “no momento da expedição dos precatórios, independentemente de regulamentação, deles deverá ser abatido, a titulo de compensação, valor correspondente aos créditos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora ” (na verdade, líquido e certo é somente o crédito fiscal inscrito como Dívida Ativa). O dispositivo parece justo, ao impor esse “encontro de contas” e, como dispensa expressamente e regulamentação, bastaria ao Tribunal que, ao expedir o precatório, consultasse, por via eletrônica, o cadastro de devedores da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional / Secretaria da Receita Federal e juntasse ao processo a respectiva certidão impressa. No caso de não haver débito, o precatório poderia ser imediatamente liberado. Caso contrário, uma consulta poderia ser feita por via eletrônica, com resposta em até trinta dias, a fim de que o valor do crédito fiscal em cobrança fosse deduzido do precatório e retido até o final da discussão, mas liberando-se, imediatamente, o saldo credor.

No entanto, ao contrário disso, os arts. 30 a 44 da Lei nº 12.431, de 27/06/11 (em que foi transformada a MP nº 517/2010), ao regular, desnecessariamente, a Emenda nº 62/2009, criou um novo, longo e burocrático processo para a audiência da Fazenda Pública e a concretização da compensação. São 16 artigos, 19 parágrafos e 2 incisos, ou seja, 37 normas a serem seguidas para vialibilizar a compensação. Portanto, a decisão do Supremo Tribunal foi, na verdade, uma vitória improfícua, uma vitória de Pirro dos titulares dos precatórios, pelo menos até que a Emenda nº 62 também seja declarada inconstitucional.

 

Jornal do Comércio, 31 de agosto de 2011

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