Empreendedor sênior a serviço de novos desafios

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Histórico

Em fevereiro de 2020, eu e um grupo de parceiros do programa Empreendor Sênior apresentamos ao Comitê de Turismo da CNC o projeto de Turismo Sênior, que seria lançado no dia 26 de março, no CIB-Copacabana (lançamento cancelado, por motivos óbvios), com o objetivo de convidar esta entidade para uma preleção, e também escutar sugestões e críticas ao projeto para uma possível extensão aos demais parceiros do trade turístico. No último dia 31 de março, em pleno isolamento da pandemia, recebi um convite da CNC para escrever um artigo.

Embora sentisse todos os contratempos que a situação oferece a um mundo isolado, regido pela total paralisação em todos os setores de atividades e modificações estruturais de cenário, aceitei de pronto o convite, por considerá-lo uma oportunidade não só de ter uma “tarefa” muito bem-vinda para reflexões num momento em que máscaras cobrem nossos rostos, como também de fazer um exercício de comunicação pessoal e prospecção futura de possíveis novos caminhos.

Interrogo-me se os dados de que disponho até o momento são suficientes para esta aventura futuróloga, mas acredito que a missão empreendedora não permite a indiferença, ou a acomodação. Empreender é estar desperto e sensível para o mundo e participar nas possíveis mudanças, ousando e arriscando ler sinais que emergem no dia a dia. Preocupa-me que o esplendor do empreendedorismo, muitas vezes cantado em prosa e verso, possa ser uma grandeza ameaçada pela habitualidade e rotinas. O processo empreendedor não é fruto só de uma realidade: ele absorve as abstrações, generalidades e experiências passadas, do presente e se arrisca a um diagnóstico futuro.

Assim, tomo a liberdade de dar asas às minhas ingenuidades e ignorâncias, abrir uma escotilha para possíveis novos panoramas, pelo que antecipadamente peço minhas desculpas àqueles que ousarem ir até o final deste artigo, refletindo, analisando e tentando esclarecer este fenômeno que vivemos, mas que, a meu ver, estende seus tendões para um processo marcante de pós-pandemia. São dois temas que pretendo explorar neste artigo:

A influência da envelhescência nos mercados mundiais. Relato de minhas experiências em 2017, antes da pandemia;
A influência do pós-pandemia na economia. Possíveis visões a curto e médio prazo para o turismo.

 

I-Influência da envelhescência nos mercados mundiais

Relato e reflexões de minha envelhescência

Tudo começou em algum fevereiro, quando entrei na era dos 75 anos e certas preocupações e lucidez se incorporaram ao meu pensamento, perguntando-me diariamente qual a duração do meu ciclo de vida.

Além do limite físico e temporal da minha “máquina”, outros conceitos e entendimentos foram se integrando às minhas reflexões, como a observação dos objetivos que tracei para a minha nave-vida e a velocidade quase frenética que imprimi em alguns trechos do percurso. Pude analisar com calma – que nunca tive –, o mar que estava percorrendo, os ventos que enfrentava, e, o mais importante: a embarcação tomou o rumo que eu gostaria de ter dado a ela? Olhando para a carta náutica da minha vida, havia algum sonho ou desafio que gostaria de ter percorrido e do qual, por medo ou outras questões, eu me afastara?

Foi assim que percebi como me afastei de mim mesmo sem me dar conta, e quantos sonhos ainda tenho dos quais, a cada dia, a rotina esmagadora não me permitia ter consciência. Tornei-me um homem-robô, sempre predisposto a repetir atitudes e interpretações conhecidas. Dessa forma, atropelei muitos sentimentos, não aprendi com o que acontecia ao meu redor e deixei para trás muita coisa que ainda gostaria, realmente, de realizar.

Nunca havia me questionado sobre isso, já que considerava o ponto da curva de minha longevidade a “mil léguas de distância” do que se encontra hoje. Não se trata da definição da transitoriedade de vida, pois uma máquina de escrever pode durar muitos anos fisicamente, mas o tempo que se leva para executar nela algumas funções é tão dispendioso que acaba sendo colocada na prateleira dos descartáveis.

A minha questão estava relacionada com a qualidade de vida que poderei empregar à minha “máquina” para as caminhadas que ainda pretendo percorrer com energias e vibrações.

Sinto que continuam a correr em minhas veias as sementes de liberdade para planos e pretensões antigas. O curioso é descobrir que, para construí-los, devo buscar outros significados e me desconstruir, criando novas soluções para velhos hábitos, acomodações e inércias ao iniciar um novo ciclo de vida. Tudo isso, antes que provenha uma obsolescência rápida de minha máquina. É preciso matar a múmia fantoche e fazer renascer, literalmente, o ser vivo que sou, ativo, independente, capaz de assumir um caminho autêntico na vida.

Penso que esta época inovadora, do agora e do futuro, tem que ser diferenciada das anteriores. Quem sabe consigo mudar a posição do pretensioso cachimbo na minha boca já moldada? Quem sabe, re-construir um empreendedor que saiba identificar as oportunidades e transformá-las em algo de valor pessoal e coletivo, em qualquer estágio, situação e local: que seja criativo, inovador, arrojado, e estabelecer estratégias para delinear meu novo futuro? Poder traçar novas metas, iniciar novos projetos esquecidos no fundo do baú, mas ainda acalentados na alma, visualizar e buscar não só o sucesso, mas as alegrias de um novo empreendimento – que pode ser cuidar de flores, fazer artes, tocar numa banda de rock, ou ser presidente de um time de futebol.

Como vivi grande parte da vida como um pequeno empresário e no magistério universitário, aprendi, com os economistas e especialistas em negócios, que uma das características mais importantes de um empreendedor é sua vantagem competitiva, definida como o poder de converter seus ativos estratégicos em conquistas de melhorias de seu bem-estar. Se isto é um postulado da atualidade, meu plano futuro de vida deve conter metodologias de maneira a não só manter minha capacidade de aprender, mas, principalmente, desenvolvê-la de forma inovadora.

Entendo que o chamamento a se tornar empreendedor requer o entendimento de que cada passo na escala da ascensão não é um passo para a liberdade e enriquecimento pessoal, mas para o compromisso coletivo. Quanto maior o crescimento do empreendedor, mais severa a servidão. O simples incitamento teórico isolado realizado em salas de aula, ou por meio de algumas leituras, pode levar, no máximo, ao despertar de algumas fagulhas de conteúdos que, na verdade, só adquirem corpo e materializações se forem acompanhadas por vivências experienciais que só podem ser percebidas num caminho árduo, e acima de tudo solitário, ao longo de anos.

Esse processo solitário do candidato a empreendedor, que não exime o auxílio de conselhos e informações em todas as questões privadas, “até mesmo conversar em latim com as plantas”, precisa criar condições de um isolamento para suas análises e intuições, tão necessárias às introspecções e absorção de conhecimentos.

Mas, como descobrir verdades encobertas e descortiná-las se, muitas vezes, a vergonha me impediu de revelá-las para mim mesmo? O cerne da questão é que fazer essas associações requer esforços profundos e coragem para enfrentar o caos.

Nietzsche disse, por intermédio de Zaratustra, que somente o próprio indivíduo é que pode enxergar o seu caos e dar luz à sua estrela dançante. Logo, existe a necessidade premente do enfrentamento, da luta corpo a corpo com o caos. É como lidar com uma cebola, em que, para se atingir o cerne, é preciso sentir a intensidade do desfolhamento e, talvez, até chorar.

A necessidade de redefinir o que pertencerá a esta capacidade de se tornar um novo empreendedor, agora na envelhescência, exige uma interação clara e objetiva das experiências marcantes passadas, da percepção dos cenários que acontecem agora e sua repercussão interior, dos desejos e vontades íntimas dos sonhos que foram colocados para escanteio, mas que desejo ainda realizar com a liberação dos meus insights. Faz-se necessária uma interação constante entre passado, presente e futuro.

Minha teia da habitualidade (antes da pandemia)

Sempre me preocupei em observar detalhes que pudessem me trazer novos aprendizados e, ao notar que meus comportamentos estavam me transformando numa múmia-viva, comecei a achar que estava contagiado por uma “doença paralisante”, dessas que não prejudicam o corpo, mas que podem ser contraídas em contato com um vírus ou bactéria da modernidade.

Percebi também que não era só eu a estar incomodado. Talvez fosse uma doença coletiva, com forte tendência a afetar a mente das pessoas. Quase imperceptível em seu processo inicial, porém com sintomas abrangentes no seu desenvolvimento. Levei certo tempo para entender que tipo de doença era essa.

Os efeitos dessa doença podem ser incontroláveis: transformam pessoas em múmias-vivas, cada vez mais alheias a tudo, e incapazes de qualquer reação. Quando me dei conta do que estava acontecendo comigo, tentei pensar em algum remédio ou tratamento que fosse capaz de evitar tal alienação.

Comecei a pensar em procurar alguns terapeutas, psiquiatras, ou filósofos. Quem sabe tudo aquilo não seria fruto de entendimentos errôneos de alguns conceitos básicos que pudessem ter me levado a esta situação?

Após diversas consultas, percebi que o problema era proveniente de um aracnídeo que tecia um turbilhão de fios, cheios de um fluxo veloz e massacrante de afazeres e informações em volta de mim, exigindo-me cada vez mais tempo para realizações e análises para seus entendimentos. Fui me tornando um escravo, exigindo-me melhor desempenho laboral a cada dia para atender a um senhor insaciável por melhor eficiência e produtividade – eu mesmo.

Dia desses, abri meu e-mail e deparei-me com uma reflexão acerca da quantidade de compromissos a que nos obrigamos diariamente. A reflexão expõe constrangimentos e preocupações com o assunto, mas, curiosamente, também mostra a incapacidade de realizarmos somente um desses compromissos de cada vez. Permito-me copiar o relato anônimo:

Que bom que já estão identificando o mal que sofro, agora só falta descobrirem a cura. Mais alguém sofre deste mal? Vou tentar explicar melhor:

Certo dia, decidi lavar o carro, rumei em direção à garagem e notei minha correspondência largada em cima da mesa. OK! Vou lavar o carro, mas, antes, vou dar uma olhadinha na carta, pois pode ter algo urgente. Ponho as chaves do carro na escrivaninha e, quando vou jogar fora as propagandas inúteis, noto que a lixeira está transbordando.

Vou colocar as contas a pagar na escrivaninha e jogar o lixo fora, mas quando chego lá fora, dou de cara com a caixa do correio, decido voltar e pagar primeiro estas contas. Agora, onde está o meu talão de cheques? Encontro-o na gaveta. Ops, tenho apenas folha. Meus novos talões devem estar na escrivaninha.

Oh, lá está o refrigerante que eu estava bebendo! Vou buscar aqueles talões, mas antes eu preciso levar essa latinha para longe do computador. Talvez seja melhor colocá-lo na geladeira para gelar um pouco. Vou em direção à cozinha e vejo o jarro de flores. As flores precisam urgentemente de água.

Coloco a latinha no balcão da cozinha e oh! Achei os meus óculos! Procurei por eles a manhã toda! Melhor eu guardá-los logo. Encho um regador com água e vou em direção às flores… aaah! Alguém deixou o controle remoto da TV na cozinha. À noite, quando formos assistir à televisão, nunca iremos pensar em procurá-lo na cozinha, então é melhor levá-lo para a sala, onde é o seu devido lugar.

Rego as plantas e, sem querer, derramo um pouco de água no chão. Jogo o controle remoto no sofá, vou andando pelo corredor e tento me lembrar o que eu estava indo fazer.

Final do dia: o carro não estava lavado, as contas não estavam pagas, a latinha de refrigerante estava largada no balcão da cozinha, as flores foram regadas apenas pela metade, não sei se tenho novos talões de cheques e parece que não encontro as chaves do carro.

Quando tento entender o porquê de nada ter sido feito hoje, fico atônito, pois sei que estive ocupado o dia todo! Percebo que isto é uma coisa seriíssima e que irei em busca de auxílio, mas antes, acho que vou checar meu e-mail.

Em tempo: favor enviar isto para todo mundo que você conhece, pois eu não me lembro para quem eu já enviei! Mas não mande de volta para mim, ou posso enviar para você de novo.

Apesar de eu estar dando risadas dessa confusão instaurada, comecei a fazer uma análise mais aprofundada daquilo que parecia banal. Por que muitos de nós temos esse hábito de iniciar uma série de tarefas e não levar quase nenhuma delas “aos finalmentes”?

Mas, além da enorme quantidade de afazeres diários, quantas são as informações descarregadas, a cada instante, ao nosso redor? O desenvolvimento tecnológico das redes de comunicação faz surgir novos produtos com tecnologias mais sofisticadas, integrando-nos a outros acontecimentos mundiais por meio de satélites espaciais. Assim, tornamo-nos cidadãos do mundo, que carregam sobre os ombros, além dos próprios problemas cotidianos, todo um turbilhão de informações provenientes da globalização.

Com esta globalização, vi surgir um exército de sentimentos marcados por angústia, estresse, insônia, depressão, decorrentes deste vazio existencial, cada vez maior e mais difícil de ser resolvido. Apesar de estar em atividades constantes, fazendo tudo ao mesmo tempo, a realidade é que muitas vezes não sabia qual o sentido da vida, e, nessas corridas, não sabia onde estava a faixa de chegada. A impotência individual de dar conta de tudo transformava-se em desânimo, frustração e desespero. Por outro lado, se a postura for de acomodação, hibernação umbigocêntrica, não haverá sinais suficientes para o aprendizado. Ao permanecer dentro da casca de um ovo, à espera somente da proteção divina, pode acontecer o pior: um elefante pisar no seu ovo e você nem sentir.

Para não escandalizar minha família, iniciei por conta própria análises de alguns conceitos prioritários que direcionavam minhas atividades: o primeiro foi o da destruição criativa, cunhado por Schumpeter. Na época, havia entendido que destruir produtos e serviços, atendendo à programação de um ciclo de vida pré-definido, era uma necessidade das empresas para, dessa forma, abrirem espaço para a criação de novos modelos. Meu entendimento não estava de todo errado, entretanto era superficial enquanto limitado à cultura mercadológica empresarial.

Com o passar do tempo, percebi que o contexto da destruição criativa estava direcionado somente aos negócios, e deveria ser incorporado também à vida pessoal. Hábitos e rotinas, muitas vezes, constituem “mecanismos” que impedem a integração, mesmo que mínima, entre o que fazemos e o que pensamos ou desejamos. Estamos perdendo a condição de escuta e entendimento devido às “engrenagens da mecanização” desenfreada, gerando ambientes propícios para o cultivo de uma plataforma de medos, ansiedades, angústias por perdas financeiras, econômicas e emocionais.

De acordo com Santo Agostinho, o hábito é a segunda natureza do ser humano. Se assim for, será muito difícil reagirmos à tal epidemia estagnante. De fato, somos presas fáceis dessa rede, pois a ela nos acostumamos rapidamente. De início, a ligação é fraca, mas agora já nos imobilizou, tornando-nos inúteis, descartáveis e obsoletos.

Percebo que meus relacionamentos, ao invés de se tornarem mais líquidos e fluidos, conforme o preconizado por Zygmunt Bauman, na verdade, tornaram-se mais sólidos e pesados. Em consequência, sentia um embrutecimento cada vez mais rápido e veloz das pessoas, pela perda de consciência e falta de reflexões acerca dos ambientes turbulentos e incertos que vivemos.

Para que isso não acontecesse comigo, utilizei uma das fórmulas de Thomas Edison: Tenha em mente e conserve as boas ideias que outros tenham usado com sucesso em suas áreas. Assim, não é preciso inventar a roda; basta estar atento e conhecer a roda criada, para adaptá-la ao meu problema. A adaptação da roda, por si só, é a solução inovadora, que exige, além de grandes exercícios e treinamentos diuturnos, analogias e conciliações em assuntos de interesses diversos aos meus. 

Talvez assim, pudesse surgir um estímulo e uma oportunidade para trazer a destruição criativa para os meus hábitos, estruturas e comportamentos já obsoletos.

É com esse desafio que me defrontava e ainda me defronto. Como poderei enfrentar e reagir a esse processo quase que parasitário? Como colocar em ação uma prática reflexiva nesta atualidade de mudanças drásticas e velozes? Como registrar, fotografar, tatear o instante em que nós somos contaminados, nos tornando insensíveis e apáticos?

Essa é a significância dos dilemas ou situações difíceis: em nossas vidas são constantes as encruzilhadas, nas quais é necessário decidir se vamos para a direita, esquerda, ou se permanecemos no centro. Nem sempre podia continuar na trajetória programada, e tinha que tomar a decisão sobre qual trilha seguir, mesmo sem os conhecimentos profundos daquela situação. A falta de organização diária, de disciplina pessoal e de um banco de dados nos impede, muitas vezes, de encontrar as melhores soluções, o que nos conduz a uma rotina de vivências circulares, tal qual um cachorro, correndo atrás do próprio rabo, sem nunca conseguir atingi-lo.

Mas ter em mente a direção da linha de chegada, e procurar seguir as intuições e sensibilidades expressas neste momento, pode ser uma bússola da solução.

Entretanto, as intuições e sensibilidades de que somos possuidores e às quais sabiamente recorremos em momentos de poucos conhecimentos disponíveis não são infalíveis. Ao seguir uma trajetória, é de fundamental importância ler e entender os sinais emitidos no percurso, verificando se a direção e o sentido são os que nos pareçam desejáveis. Assim, caso sentisse que essa mudança de ambientes estava correspondendo aos meus anseios, continuaria em frente; caso contrário, retornava ao ponto inicial do labirinto, ou criava outro, com sentido diferente.

Mas, apesar dessas idiossincrasias, foram se acumulando ao longo do tempo, lentamente, no meu espírito envelhescente, certas vontades e desejos ainda intensos, latentes e disponíveis para atingir alegrias e emoções mundanas, que ainda não tinha presenciado.  Eles foram se enquadrando no que Aristóteles definiu como fundamentos da realidade, e que eu assimilei como sabedorias e vontades retrospectivas, ou seja, a vontade de sentir algo diferente, quando se alcança a envelhescência, ou maior idade, mesmo em situações habituais e monótonas. 

Anexei ao meu dia a dia a construção do que denominei Diário do Empreendedor, um exercício de escrita diária dos fatos mais significantes do dia. Podia provir de um bate-papo, uma leitura, uma notícia de tevê, um achado num livro, ou qualquer outro elemento que pudesse me proporcionar reflexão e autocrítica, permitindo elaborar experiências num banco de dados sobre minhas atividades. Escrever é de fundamental importância para que as máscaras caiam e deixemos exposto o nosso eu, um indivíduo passível de erros e acertos, atento aos detalhes que entremeiam as tortuosidades da própria jornada.

Só um exercício disciplinador pode romper com o atual pensamento paralisante e promover questionamentos com desafios novos, influenciando ações e fatos portadores de futuro.

A pausa para escrever oferece uma grande liberdade: a de “dançar na maionese”, ou seja, a possibilidade de fazer extrapolações imaginárias dos pensamentos e percepções, às vezes loucas, mas que possibilitam dar asas às ideias não lineares de raciocínio. É preciso soltar as emoções contidas e vontades instintivas e deixar fluir a autenticidade.

É preciso saber lidar com o inesperado para cultivar atitudes e olhares diferenciadores para necessidades iguais; agir e sentir que cada situação é distinta. A coerência das nossas atitudes advém da continuidade desse exercício.

A velocidade é fator intrínseco, e faz parte da genética da globalização do progresso. Assim, não existe futurólogo que se preze incapaz de prever que a cada instante ela será maior. A questão básica é que a velocidade que faz suplantar bens e serviços também está sendo levada aos relacionamentos e diálogos entre as pessoas, especialmente se de diferentes gerações.

É preciso estar com o coração aberto e atento para captar tudo que significa algo para nós, dentro de nossos valores e desejos. Para isso, é necessário que haja uma relação de transparência entre o que sou, o que penso, o que vivi e o que pretendo viver. O resultado dessas quatro etapas, baseadas na vivência e escrita das emoções no Diário do Empreendedor, é a ressonância entre o pensar e o agir em busca do que verdadeiramente acreditamos.

Assim, a lógica massificada incute que “o jovem é a bola cheia” e “o velho é a bola murcha”. Enquanto todos os apelos mercadológicos realçam o novo, as experiências adquiridas pelos mais velhos, e transmitidas às suas comunidades para uma maior longevidade e menor desperdício de recursos, vão se perdendo. Muitos dos conhecimentos sobre a vida esvaem-se pelo ralo, pela falta de tempo e de diálogos “olho no olho”, que os eletrônicos não mais permitem.

Em contrapartida, novos e promissores mercados surgem nos campos do rejuvenescimento, da comunicação e dos tratamentos estéticos de última geração, que permitem avanços, mas proporcionam gigantescas ilusões fornecidas por espelhos mágicos que repetem em voz melodiosa e penetrante: hoje você vai ser mais jovem que ontem, e muito mais feliz.

Minhas experiências nas áreas do empreendedorismo e inovação me mostram que os dois vetores de realização – o querer e o fazer – quase nunca se integram e, pelo contrário, um é quase inimigo mortal do outro. Muitas pessoas querem algo e não conseguem fazê-lo e, quando o fazem, surge a dúvida se realmente o querem. 

Do ponto de vista estritamente pessoal, até que o desafio de unificar o querer com o fazer não é, de todo, impossível. Entretanto, ao pensar no desenvolvimento coletivo, a tarefa se complica (e acredito que o atual isolamento tem contribuído para reflexões a esse respeito).

A partir dessa consciência, a cooperação e a solidariedade ganham espaço, contexto no qual o mar vermelho da competitividade vai se transformando em um mar azul, conforme definido por Mauborgne e Kim. Aos poucos, a competição vai se transformando em coopetição, na qual o indivíduo se integra não só ao seu próprio ambiente – dentro da casca de um ovo, a vestir as camisas das onze posições –, como também passa a se preocupar com a sustentação diária de sua comunidade. Nesse novo cenário, o individual passa a dar as mãos ao solidário global.

O re-significado de ser um Empreendedor Sênior

Em 2017, parti para um ano de pesquisas para o meu pós-doutorado na Universidade da Califórnia, em Davis. A população da cidade, com excelente qualidade de vida, muito bem posicionada no ranking de preservação do meio ambiente e sustentabilidade, e pesquisas de ponta nos setores agrícola e de saúde, é formada basicamente de estudantes e aposentados.

Meus primeiros meses foram de grandes dificuldades e com resultados nada estimulantes.  Todos os meus trabalhos receberam observações de que eu necessitava ser mais objetivo e conciso, e muito menos prolixo. Percebi que meu significado de empreender era muito diferente da forma objetiva e sintética dos americanos.

Deveria desenvolver uma ponte direta entre minhas ideias e as formas para que as aprendizagens de situações não sumissem como bolhas de sabão. Renegar o artificial, as formas rebuscadas e indiretas de comunicação, para dar lugar ao ser natural, original e autêntico, sem me preocupar com as arquibancadas. Procurar me tornar um instrumento de realizações para a alma, de modo a criar uma correlação direta entre a sinceridade das emoções e as atitudes.

Durante minha permanência, participei de diversas reuniões em entidades públicas, associações de moradores e empresariais, escolas técnicas, conselhos da Universidade da Califórnia, ONG´s e também em partidos políticos locais, procurando conhecer como os cidadãos americanos resolvem seus problemas cotidianos; como vencem as distâncias de suas individualidades e como se integram às decisões coletivas.

Um ponto em comum me chamou a atenção em todos esses encontros: as rodas de debates. Um facilitador orientava as discussões sugeridas numa pauta pré-estabelecida, para um público formado por equipes operacionais dos respectivos órgãos ou associações, e por aposentados e reservistas de outras entidades locais, com experiências e habilidades nos problemas apresentados. A missão de todos era encontrar soluções, integrando as competências e experiências dos aposentados e reservistas às dos funcionários, para que os escassos recursos financeiros não fossem desperdiçados. Tudo em nome de evitar repetições de erros já cometidos.

Conhecendo as grandes diferenças culturais, econômicas e sociais que nos separam das nações desenvolvidas, acreditamos que o momento era propício a nos questionar: Como re-iniciar um processo de mudanças para o Brasil que queremos? Como utilizar as competências e habilidades individuais de aposentados e reservistas para novos desafios?

Ao retornar ao Brasil, eu, parceiros e universidades começamos a elaborar o programa Empreendedor Sênior, cultivando um re-significado à envelhescência, para trazer de volta ao mercado de trabalho pessoas que passaram dos 50 anos, baseado em tendências que julgamos de grande intensidade.

O Sênior Boom

Levantamentos oficiais apontam que a sociedade brasileira enfrentará, num futuro muito próximo, grandes desafios em sua estrutura populacional. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), divulgada pelo IBGE: a população brasileira manteve a tendência de envelhecimento dos últimos anos e ganhou 4,8 milhões de idosos desde 2012, superando a marca dos 30,2 milhões de idosos em 2017, com crescimento de 18% em cinco anos. Prevê-se que, em 2030, o número de aposentados será maior que o de trabalhadores na ativa. Além dessa tendência de envelhecimento, verifica-se que grandes empresas brasileiras realizam um número crescente de programas de demissão voluntária, liberando do compromisso laboral um contingente de profissionais com grande capacidade produtiva, além de vontade de ser útil e compartilhar experiências – uma forma altamente positiva (e produtiva) de evitar estados de depressão e baixa autoestima. (https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/ (27/3/2019))

Segundo a OMS – Organização Mundial da Saúde, hoje, pela primeira vez na história, a maioria das pessoas pode esperar viver até os 60 anos ou mais.

Em 2031, o número de brasileiros com mais de 60 anos vai ultrapassar o de jovens com até 14 anos. Em 2060, 1 em cada 4 brasileiros será idoso, 25% da nossa população terá mais de 65 anos.

 

Fonte: IBGE -2018

Características de nossa época -2020

Longevidade da sociedade. Do baby boom ao sênior boom
Velocidade das comunicações
Obsolescência acelerada de produtos, processos e serviços
Lixo eletrônico se expande para a sociedade.
Rugas humanas dos mais idosos são consideradas como “coisas” obsoletas
Desperdício – Grandes experiências acumuladas em período de funcionalidade são colocadas “fora do baralho” do mercado

 

ESTRATÉGIA GERAL: Necessidades de aumento de produtividade e experiências em nossas empresas e instituições.

Objetivos do Programa Empreendedor Sênior

O Programa Empreendedor Sênior visa articular e integrar experiências de profissionais acima dos 50 anos em diversos segmentos da sociedade: universidades, empresas, órgãos das forças armadas (Marinha, Exército, Aeronáutica) e startups, no sentido de que seus especialistas possam colaborar para o aumento da competitividade nacional, ou cooperar para a formatação de pesquisas e negócios inovadores com objetivos de:

Criar uma metodologia sistêmica para aproveitamento das experiências e expertises de aposentados e reservistas com 50+, em empresas, entidades e órgãos públicos e privados;
Estreitar relacionamentos entre diferentes gerações para melhorias da produtividade empresarial;
Elaborar um banco de dados de competências e habilidades de pessoas que queiram participar com suas experiências para o desenvolvimento competitivo do Brasil;
Evitar repetições de erros cometidos no passado, motivando a aplicação de novas (e/ou antigas) experiências de gestão.

As experiências, competências e sensibilidades de aposentados e reservistas, cunhadas ao longo de décadas, não podem ficar desperdiçadas nas diversas áreas de atividades que requerem avanços e progressos. São forças, instrumentos e ferramentas motivadoras para transmissão de conhecimento e valores, importantes canais para trocas e reavaliações para diversas entidades, para introdução de novos processos e metodologias, oferecendo o equilíbrio necessário entre as novas necessidades específicas, o desabrochar de novos desejos e talentos e aqueles que puseram suas “mãos na massa” por muito tempo.

O caráter transformador do Empreendedor Sênior vem da necessidade de despertar no participante a consciência de que ele é ainda um ator em sua comunidade, e que atuando em conjunto com seus pares pode atingir objetivos jamais imaginados. Ele pode ajudar a transformar sua realidade local. Um trabalho solidário em uma comunidade requer muito mais do que simples palavras e vontades. Requer tempo, organização, estratégias, metas e planos bem definidos.

Esta massa de conhecimentos da envelhescência deseja voltar a sentir o pertencimento à comunidade.  Por menor e mais simples que seja o fio colocado neste tecido social complexo, o sentimento de pertencimento à comunidade faz parte de nossas necessidades básicas, e colocar as experiências de nossos “envelhescentes” a serviço da sociedade tem, assim, duplo benefício.

Então, o que fazer? Desistir de lutar por mudanças e esquecer nossos sonhos, ou nos voltar para discussões e projetos básicos para nossa sociedade?

O caráter transformador do programa Empreendedor Sênior vem da necessidade do diálogo e interações entre a teoria e a prática, entre o novo e valores tradicionais, o que permite cada vez mais e melhor as visualizações dos pequenos detalhes para suas realizações.           

Ferramentas de Trabalho: Rodas de Debates

As rodas de debates presenciais e online são ferramentas de trabalho do programa Empreendedor Sênior que visam impulsionar e estimular reflexões e análises através de encontros entre pessoas com experiências em diversas áreas interdisciplinares, selecionadas juntamente com órgão de classe, associações de moradores, empresas, incubadas, startups e outras, interessadas em aumentar a competitividade nacional com admissões de empreendedores seniores para auxiliarem no entendimento do contexto do cenário econômico, social e ambiental, evidenciando perspectivas para desenvolvimento de empreendimentos inovadores pessoais ou coletivos.

Essas ferramentas da “tecnologia da experiência e competência de sensibilidades” devem ocupar todos os degraus e níveis de relacionamentos, tanto em empreendimentos inovadores, como na administração pública e privada, pois são suas forças motivadoras que transmitem uma decisão duradoura solidária e humana, ao contrário das relações impessoais, nas quais se transmite uma sensação de artificialidade, onde tudo é insignificante e não vale a pena mover um dedo.

II-Perspectivas da economia e o turismo para o Empreendedor Sênior pós- pandemia

O sênior boom é um fato insofismável e representa um grande percentual da população mundial. E, hoje, os segmentos da população dos 60+ estão num nicho de risco com esta pandemia, daí a grande preocupação das mídias ao reforçarem os cuidados que as famílias precisam oferecer aos seus pais, avós e bisavós.

Será que as experiências deste isolamento se refletirão em mudanças de comportamento no turismo? Quais os vetores importantes nas modificações do dia a dia que teremos daqui para frente na economia como um todo, e suas repercussões no turismo?

Os fatores de aceleração com os quais os produtos, processos e serviços se tornavam obsoletos já eram bem conhecidos e absorvidos por todos os setores empresariais, antes mesmo da pandemia. O que está ocorrendo neste momento é a aceleração e utilização de algumas plataformas digitais que estavam nas prateleiras ainda sem utilização, ou com pouca utilização, como por exemplo as vídeoconferências, as imagens por realidade virtual que estão possibilitando novas saídas mercadológicas, conhecimentos, informações, e mecanismos de comunicação e interseções multissetoriais nas mais variadas atividades. É obvio que tanto as viagens nacionais como as internacionais de turismo e negócios diminuirão substancialmente pelas transferências por videoconferências, mesmo após o encontro da vacina para a covid 19. Um turismo online de convivência, e com entregas (deliveries) de porta a porta, surgirá como fontes de conhecimentos e experiências globais, associados também às formas logísticas de fornecimento das cadeias setoriais locais. “Conheça Nova York, desfrutando os seus museus, teatros, monumentos históricos, os sabores de seus hambúrgueres, tomando um vinho californiano, tudo isto online e com entrega a domicílio”. Prevê-se um crescimento muito rápido de empresas de logística e entregas a domicílio.
As forças de negociação entre grandes corporações, pequenas e microempresas ganharão mais flexibilidade na compra e venda de seus produtos e processos, dado que muitas empresas precisarão reformular suas cadeias de fornecedores, antes dirigidas para a China em função do menor custo da mão de obra.
O comércio e a industrialização em pequenas e médias empresas locais poderão se tornar cada vez mais elos das cadeias de suprimentos das grandes empresas.
Entendo que a situação expôs um drama de comunicação e conhecimentos estatísticos e matemáticos, tanto da mídia como em geral, uma vez que nosso país não desfruta de uma educação matemática de qualidade, o que repercutirá em profissões do futuro, cada vez mais procuradas. A falta de informações e interpretações de análises estatísticas de letalidade expôs uma grande abertura para aprofundamento e negócios nesta área.
Neste cenário atual de total isolamento provocado pela pandemia, uma extrema rapidez de inovação está se processando dentro dos lares, talvez de forma individualizada, mas se consegue perceber esforços para se criar ambientes para compartilhamentos de conhecimentos coletivos de cooperação, e ambientes de interação entre os diversos atores familiares.
Uma forma diferenciada de disciplina coletiva surgirá para propiciar uma ação antiestresse, de modo que todos possam se sentir integrantes e reconhecidos por auxiliar em projetos comunitários de desenvolvimento saudável coletivo de convivência, gerando benefícios para os fora de sua curva social.
Trata-se, portanto, de criar uma ampla visão sistêmica – uma espécie de “disciplina da fila”, em que nosso famoso “jeitinho brasileiro” terá de dar lugar a uma consciência mais ampla do todo -, que abrange não apenas os aspectos imediatos e momentâneos, ligados diretamente ao seu interesse particular, mas também aspectos relacionados aos recursos e infraestrutura básica coletiva em ambientes de interseções de diversos locais que se comunicam entre si. Nosso jeitinho de tirar vantagens em tudo pode sofrer mudanças que nunca imaginei.
Assim, estar linkado à destruição criativa,conforme definido por Schumpeter, como força motriz ao crescimento econômico, por meio do qual novos produtos destroem empresas velhas e antigos modelos de negócios, ganhará novas ênfases holísticas na criação de processos por ataques invisíveis aos exércitos de vírus, associando seu negócio, antes individualizado, à saúde.
Será exigido que todos os empreendimentos, sejam eles pessoais, socioambientais, científico-tecnológicos ou empresariais (públicos ou privados), proporcionem uma sistematização de processos e controles comportamentais entre as pessoas e comunidades de verificação permanente das forças que atuam na sinergia entre as necessidades presentes ou futuras e as condições estruturais locais para a realização dos atendimentos desejados.
Infelizmente, o desemprego crescerá muito na economia em geral e particularmente no turismo durante os próximos 4 a 5 anos, principalmente nos transportes aéreos, hotéis, cruzeiros etc.
A reeducação e o treinamento para a massa de desempregados deverá ser uma das prioridades para a recolocação profissional. Recursos financeiros governamentais e privados deverão migrar para cursos básicos de computação digital em instituições de ensino básico e técnico e serão ênfases para os próximos 5 anos.
Possíveis modificações estruturais nas cadeias produtivas de fornecimento: Entendo que um retorno e estímulo de PME´S surgirão por parte das grandes empresas para compras locais e nacionais. A apreciação e análise sobre custos diretos e indiretos de produtos e serviços sofrerão modificações com a interação da saúde com a economia.
Os estabelecimentos de ensino a distância (EAD) terão mais acessibilidade e credibilidade, com mais sinergias online com entidades de ensino internacional.
Novas teses e estudos acadêmicos deverão priorizar o estudo de geopolíticos, o protecionismo às empresas nacionais em detrimento a uma visão que considera somente menores custos de fabricação.
Acredito que os planos de saúde sofrerão grandes modificações jurídicas para direitos individuais e de grupos para controles de epidemias.

Conclusão: Um convite especial

Através de histórias e novelas da carochinha, criamos e forjamos ídolos que chamamos de “salvadores da pátria”. Esses tinham o direito de serem mostrados por mais de 30 segundos em cadeia nacional para o mundo. Tinham direito também a capas em revistas mundiais. Importante para a família e a sociedade era aquele que diante de qualquer problema dizia: “Deixa comigo que eu resolvo”- o que sempre buscou sentido de vida para si mesmo, independentemente de outras pessoas. 

 É mais fácil procurar, encontrar ou buscar um culpado, quando fortes emoções estão envolvidas, do que participar de decisões difíceis. Quando se sabe quem é o culpado, podemos descarregar as vinganças, pois uma causa impessoal impede esse descarrego.

Em momentos de guerra, tsunami ou pandemia, a sociedade tenta se preservar e construir uma maneira inteligente para sobreviver, juntando todos os homens e mulheres de diferentes posições políticas a colocarem sacos de areia para impedir uma invasão ou uma inundação. Eles precisam cooperar entre si, para conseguir o que não podem alcançar sozinhos.

Infelizmente, a cooperação não é realizada com discursos ou escrevendo-se a expressão: “Tamo junto”.  A cooperação exige um grande esforço, grandes habilidades, e prática para reunir pessoas de interesses diferentes ou conflitantes, que não se sentem bem umas em relação às outras; que são desiguais ou simplesmente não se entendem, mas que, num momento agudo, se mostram receptivas ao “outro diferente” para agirem em conjunto; superam suas vontades de derramar a bílis sobre a diferença, em busca de uma troca que convém à espécie humana, esquecendo-se de suas lutas políticas e partidárias.

O processo de cooperação é espinhoso, cheio de dificuldades e ambiguidades, e não raro o “pau rola”, ou alguém tende a se retirar da contenda, ou simplesmente “hibernar”. São momentos em que se exige dos indivíduos e grupos aprenderem as consequências dos próprios atos, repensarem seus comportamentos rotineiros, desenvolverem atos aprofundados, levando-se em conta que os efeitos de seus atos podem repercutir em pessoas muito diferentes deles próprios, em pequenas empresas, titulares de hipotecas em atraso ou cidadãos com dificuldades de obter uma refeição.

A cooperação está embutida na alma das pessoas, como uma troca em que as partes se beneficiam mutuamente. Uma cidade é composta de diferentes tipos de homens; pessoas semelhantes não podem dar existência a uma cidade, como dizia Aristóteles em seu livro Política. A cidade, assim, obriga as pessoas a pensar naqueles que têm diferentes opiniões, e a forma de lidar com eles. Naturalmente a agressão mútua não pode manter coesa uma cidade, e isto enfraquecerá a luta nas frentes de batalha contra o inimigo comum.

O comportamento do tipo nós-contra-eles gera uma consequência irracional. Todo o mundo é favorável à cooperação, mas na prática verifica-se o isolamento dos indivíduos, pessoas e grupos se radicalizam e poucos compartilham para a cooperação.

As relações sociais superficiais são as máscaras destas tendências para o curto prazo eleitoreiro, e desta maneira debilitam suas práticas, seus conhecimentos e seus comprometimentos com a sociedade.

Os desafios, que já eram enormes devido à evolução natural de nossas sociedades e a suas transformações frente às mudanças tecnológicas, se aprofundam dia após dia no cenário da pandemia que vivemos. O desenrolar dos fatos nos permite poucas certezas com relação ao futuro, mas uma delas é a de que nada será como antes. Mais do que nunca, portanto, quando pudermos tirar as máscaras que nos protegem contra o coronavírus, precisaremos tirar também aquelas que nos habituamos a usar para nos esconder atrás de velhos hábitos e soluções já conhecidas. Nossas velhas certezas pouco ou nada valerão diante da realidade que emergirá ao fim desta crise. Para enfrentá-la, precisaremos de toda a experiência disponível, e de processos que nos permitam consolidar em soluções inovadoras as melhores contribuições de cada um dos atores de nossas sociedades.

Por isso, nosso convite se faz ainda mais atual do que antes. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo- CNC é uma entidade sindical que representa os direitos e interesses dos quase cinco milhões de empreendedores do comércio brasileiro, e seu engajamento nas rodas de debates do programa Empreendedor Sênior poderá proporcionar novas reflexões ao seu valioso quadro, credenciando-se como uma iniciativa de visão estratégica frente às crescentes demandas do nicho de longevidade em curso na sociedade brasileira e difundindo, assim, os valores que fazem parte do DNA de seus empreendedores:

 Reivindicar responsabilidades. Não esconder seus erros. Reconhecer que a aparência de um fracasso nem sempre é um fracasso verdadeiro. Acreditar que a dor sentida em seus fracassos poderá produzir frutos futuros.
Seus objetivos são atingir a simplicidade.  Meditar e agir com seus parceiros.
Sair de sua zona de conforto para viver os riscos da inovação.
Basear-se em velhas verdades, pois há verdades das quais gerações humanas não chegaram a esgotar os sentidos.
Tentar retomar, compreender e aprender a ler as velhas verdades, mas para compreender é preciso vivê-las.
Aprender a leitura dos sinais de sua época como exercícios diuturnos.
Possuir faísca e brilho quando falam de seus objetivos. Acreditar “na arte de virar o olho da alma.”
Analisar as “pesquisas sobre o passado com um sentido atual, pessoal, formador, existencial.”
Gerar ambientes internos integrados com o mundo exterior, nos quais qualquer iniciativa pessoal é vista com responsabilidades coletivas.

E então, “tamo junto”? Ou vamos além?

Alfredo Laufer

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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